sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

2011

Lá vem o ano novo que logo, logo, sofrerá de novo de reumatismo.

PEDAÇOS

Quebrei meu nariz
goteja sangue
escorre pelos lábios
invade a boca
as papilas gustativas
Quebrei os braços
as pernas
arranquei o coração
e embalei com papel-filme
Quis mesmo desconstruir-me
criar outro feito Frankenstein
outro que não sentisse a eterna
ausência de alguma outra coisa.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

GUARDA

Passatempo
passa o tempo
passa o dia
o minuto
o instante diminuto
a cada mexida do ponteiro
quero guardar inteiro
esse cheiro
esse dia
essa memória
essa história
quero que ainda queime
essa chama
chamada vida

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

UMA COISA, OUTRA COISA

A gente dorme pra não sentir fome,
mas sente fome e não dorme.
A gente fica acordado a madrugada
inteira, só tentando viver o que não
se viveu na segunda-feira.
Olhos secos, parcas piscadas.
A gente tenta criar, mas não cria nada.
A gente tenta sucesso na calada da noite,
liga o aspirador, pode ser inspirador, mas os
que restam online são confessos em
esconder a dor.
A gente pensa que agora tudo é global,
agregado, conectado. Estamos mesmo
é mais sozinhos do que nunca.
Sonhos perturbadores revelam-me ao
pé do ouvido que a vida é pisar em
armadilhas.
Elas agarram as raízes, os pés, tornando
tudo mais pesado, lento e dolorido.
A cada passo, vai-se um pedaço, e
esperança é esperar que sobre um
pouco de você mesmo pra contar
história.

sábado, 11 de dezembro de 2010

PARADA

Era ela tão bela que quase parecia eterna. Hoje, o ônibus podia nem passar porque a parada era bem-vinda. Passou, molhou todo mundo, menos ela, bela. A eternidade é relativa. Para quem embarcou, existe.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Clarividente

Enxergava seu futuro não numa borra de café nem em bola de cristal, mas no fundo turvo da água de uma privada.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

PÉSSIMO I

Embarquei nesta viagem
truculenta, viagem de tormenta.
Muitos e muitos passageiros, eles
sem destino, sem roteiros.
Mais cobradores do que saldo
no bolso. Mais roedores do que
carne no osso.
O motorista não despista,
sai da pista.
Jesus balança e vale como qualquer
outro souvenir no retrovisor.
Alguns passageiros apresentam dor,
é o terminal. Outros apenas chegaram
mas já veem o mal.
Assentos desconfortáveis, suor
e outros fluidos corpóreos.
Todos na mesma viagem autofecundando
o seu jardim vida.
Uma hora, e não demora, o pneu estoura.
Uma hora o metal colide e nessa lide
ninguém tem cinto de segurança.
O carro virou. A gente virou extrato
de tomate. A viagem agora é de outros.